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Mostrando postagens de 2013

Verdade ou mentira?

A vida para ser boa pede socorro à fantasia. A boa fantasia.   Um eufemismo. Uma versão menos jornalística das relações. Sublimação. Uma aposta no amanhã. Sonhos. O imaginado. O lúdico. O superlativo. A hipérbole. Metáforas. O "era uma vez...". Dar um desconto na história do outro. Desconto na sua própria história. Se olharmos para a vida e relações objetivamente, de maneira cartesiana, jorn alística sufocamos a esperança. Se nossas interpretações dos textos e da vida pretendem ser jornalísticas, em busca da verdade, do "real" estaremos fadados a uma história ranzinza e ácida. E a solidão. Apologia à mentira? Pelo contrário. A favor de mais verdades. Arejar e alargar as verdades. A favor das possibilidades. Se bem que não podemos viver sem as mentiras também. Questão de sobrevivência muitas vezes! Sejamos honestos. Quem sabe uma proposta para sermos mais modestos ao interpretar o mundo, as relações, as versões, a história. Uma sugestão para olhar al

O que me faz viver.

O que me encanta não é a simetria, a consonância, a perfeição (isso existe?); o que enche os meus olhos é a dissonância, a ambivalência, a assimetria. O que me instiga não é a completude, mas a falta, o inacabado, o ainda não. O que me faz viver não é a segurança, mas os medos; não a paz, mas a angústia. O que me provoca não é a certeza, as respostas, mas a dúvida, a incerteza, as questões. O que norteia a minha ética não é a polarização entre o "bem" e o "mal", o "certo" o "errado", o "branco" e o "preto", ..., mas as diversas matizes entre eles! O que me dá esperança não é o determinismo seja qual for, no qual não acredito; mas o acaso, a imprevisibilidade, o caos. O que me fascina não é uma vida angelical ou vida pós morte, que eu não conheço, do qual podemos falar pouco, mas a Vida humana como ela é! O Reino de Deus está entre nós, nesse chão assimétrico, contraditório, livre, incompleto, imperfeito, pol

Oração de invocação. Quem invoca a quem?

“Pois nele vivemos, nos movemos e existimos.” Em muitos arraiais religiosos eu percebo com pesar um esforço olímpico para que Deus se faça presente, se manifeste, mostre a Sua glória, como se Deus estivesse na tangência da Terra esperando o momento para entrar em cena! Deus não precisa ser invocado para se fazer presente. Deus a tudo e a todos envolve, em tudo e em todos transparece, de tudo e de todos emerge. Os teólogos dizem que Ele é onipresente. Deus está totalmente envolvido com a história humana desde o seu nascedouro. Deus não está à parte do mundo, do lado de lá, distante. Convocar um Deus que é Todo-Presença é, no mínimo, contraditório. Deus está conosco, seu nome é Emanuel. Sua presença se dá de forma modesta, velada e silenciosa. Como o ar que respiramos sem nos darmos conta, Deus é o nosso fôlego; como o sol, que desde o horizonte clareia o meu quarto sem que eu esteja olhando para ele, Deus me renova; como a raiz que nutre a árvore, assim é Deus - a seiva da

Quem segue a Jesus não vive em paz!

Para dar conta do “terror cósmico”, os nossos ancestrais criaram mitos. Para lidar com os medos e insegurança o humano precisou se cercar de uma ordem, uma rotina, uma narrativa. Para se organizar, o ser humano constrói um mundo de sentidos. Diante do absurdamente inexplicável ousamos nomear. Nesse mundo de sentidos encontramos tudo o que diz respeito à cultura: a linguagem, comida, modo de se vestir, o pensamento, a teologia, as “tribos”, os guetos, a urbanização, ritos de passagem, artes e outros.  Tudo para promover certo sentido, orientação, segurança, ordem e paz. Nada mais humano! Mas quem se atreve a ser um discípulo de Jesus tem esse mundo de sentidos bagunçado vez por outra! Parece-me que a caminhada de Jesus é sempre na contra mão de uma vida organizada definitivamente, de uma fé pronta, de uma zona de conforto, do egocentrismo, da indiferença, da alienação, do sossego entorpecente. Quem segue a Jesus não pode viver em paz! “ Eu não vim trazer a paz...”

A bagunça bendita da Kenosis!

A Encarnação é a kenosis (esvaziamento) do deus vingativo, do deus que está no controle, do deus que manda matar, do deus domesticado e de um povo, do deus transcendente... A kenosis é a recusa de Deus de se identificar com o Poder, com o Motor Imóvel, com o autoritarismo, arbitrariedade, de escrever a história à parte dos homens. A encarnação é a afirmação plena do humano; é Deus gostando e ensinando a ser gente, é Jesus de Nazaré nos inspirando a abrir mão de pretensões tolas tais como a posse da Verdade, a religião verdadeira, uma fé mágica que arredonda a vida, perpetuação de dogmas. Evangelho/encarnação/ kenosis é deus deixando a companhia de anjos para se aproximar do homem, da mulher, do gay, da prostituta, do religioso, do judeu, do grego, das crianças, do índio; de todas as gentes de toda cultura, tribo e nação. A Encarnação é Deus bagunçando a lógica religiosa. O edifício que até então parecia acabado foi desconstruído quando Deus tarbernaculou entre nós! O melhor aind

"Livro do Desassossego", de Fernando Pessoa.

117. A maioria da gente enferma de não saber dizer o que vê e o que pensa. Dizem que não há nada mais difícil do que definir em palavras uma espiral: é preciso, dizem, fazer no ar, com a mão sem literatura, o gesto, ascendentemente enrolado em ordem, com que aquela figura abstracta das molas ou de certas escadas se manifesta aos olhos. Mas, desde que nos lembremos que dizer é renovar, definiremos sem dificuldade uma espiral: é um círculo que sobe sem nunca conseguir acabar-se. A maioria da gente, sei bem, não ousaria definir assim, porque supõe que definir é dizer o que os outros querem que se diga, que não o que é preciso dizer para definir. Direi melhor: uma espiral é um círculo virtual que se desdobra a subir sem nunca se realizar. Mas não, a definição ainda é abstracta. Buscarei o concreto, e tudo será visto: uma espiral é uma cobra sem cobra enroscada verticalmente em coisa nenhuma. Toda a literatura consiste num esforço para tornar a vida real. Como todos sabem, ainda q