“Pregamos a Cristo crucificado, o qual, de fato, é escândalo”. (1Co 1.23)
Uma cena nos Evangelhos que me toca especialmente é o sepultamento de Jesus! José, da cidade de Arimatéia, membro importante do Sinédrio e Nicodemos, um dos fariseus, desceram o corpo morto de Jesus da cruz, enrolaram-no em lençóis de linho com aromas e o depositaram num sepulcro novo em um jardim próximo ao Gólgota.
Que cena comovente! Que experiência carregada de humanidade e paixão! Imagino que um coquetel de sentimentos fervia na chaleira de suas almas...
O que se passava na mente de José de Arimatéia, seguidor de Jesus até então anônimo, ao tomar no colo o corpo desfigurado de Cristo coberto de sangue, pó, suor e lágrimas? E Nicodemos, que ficou com um nó na mente depois do encontro cheio de metáforas com Jesus, o que sentiu quando limpava as feridas de Cristo e o enrolava num lençol de linho? A especulação é infinita, tanto quanto nossa imaginação pode alcançar! É possível que aquele perfume tenha sido uma gostosa lembrança até o fim dos seus dias...
Mas interrompi a especulação pela constatação: o Cristo crucificado não parece nada atraente para muitos religiosos que preferem um deus útil, - uma ferramenta que se usa para um determinado fim.
Nas vitrines da fé os deuses que estão em oferta são aqueles que esbanjam somente força, autoridade, determinação e falsas promessas. Parece-me que um Deus como Jesus que morre mudo numa cruz, aparentemente inútil, não é o que interessa ao mercado religioso! O deus que “vende”, que dá ibope, que deixa a “casa cheia”, é o deus que “funciona”, o deus atendente de um balcão fast-food. O deus que interessa ao religioso moderno é aquele que cerca o homem de segurança de sorte que ele nunca vai conhecer a doença, o assalto, o desemprego, a falência, a desilusão amorosa... Pura ficção! “No mundo tereis aflições!”
O deus para quem correm as multidões não se parece em nada com o Jesus crucificado – o escândalo do Evangelho.
Mas voltando para o sepultamento dei um passo com a intenção de participar da cena! Queria ser José, queria ser Nicodemos a carregar Cristo morto no peito e sepultá-lo!
José de Arimatéia e Nicodemos abraçaram contra o peito o Cristo morto. O evangelista Marcos diz que José “dirigiu-se resolutamente a Pilatos e pediu o corpo de Jesus” (Mc 15.43).
O Deus que parece desnecessário ao mundo é quem eu tomo no colo; o Cristo que parece inútil, desfalecido, vencido é com quem me apego; o Messias escarnecido, transfigurado, sem formosura, transpassado, esgotado, crucificado é aquele que carrego! O Deus que não precisa fazer mais nada (está consumado!) já tem a minha amizade e devoção!
Respeito a Hora do meu Amigo e cuido dele...E quando cuido dele é Ele que cuida de mim! Eu cubro o corpo do Mestre e minhas mazelas são cobertas, cubro sua cabeça e Ele permeia minha mente; limpo os pés de Cristo e Ele declara os meus formosos; enrolo o corpo de Jesus no linho e minha vida é santificada; cuido de suas feridas e enxergo as minhas próprias, então Cristo me sara; banho-lhe no perfume e Ele me batiza no seu Ser; velo a sua morte e Jesus me ressuscita! ... E lembro o poema de Edward Shillito:
Outros deuses eram fortes; mas Tu fraco tinhas de ser;
A caminho do trono cavalgaram, mas Tu tropeçaste ali;
Nossas feridas apenas Deus pode entender,
E nenhum deus tem ferimentos além de Ti
Quem tem peito para carregar este Deus? Um Deus que parece vencido, que sofre zombaria, que está sendo abandonado pelos seus? Quem traz nos braços um Cristo que decepciona? É difícil ser fiel a um Deus assim. Como escreveu a filósofa cristã francesa Simone Weil “era difícil ser fiel ao Cristo. Era uma fidelidade em vão. Bem mais fácil ser fiel a Napoleão até a morte (...). Morre-se pelo que é forte, não pelo que é fraco, ou ao menos, por aquilo que, momentaneamente fraco, conserva uma auréola de força”.
Mas somente um Deus que teve ferimentos pode se identificar com os nossos ferimentos; somente um Deus que foi rejeitado pode lidar com as nossas rejeições; somente um Deus que levou sobre si os nossos pecados pode promover o perdão. “Pelas suas feridas fomos curados” (Is 53.5).
O sepultamento do qual falamos não é para o esquecimento, e sim para a ressurreição! Não estamos colocando Cristo num mausoléu para ser visitado por romeiros, muito menos em gesso, metal, madeira, enfim, num lugar de morte; mas sim num lugar existencial de onde Ele vai ressurgir por esses dias em meu coração e no seu, mas mesmo assim com os ferimentos do amor!
O Cristo crucificado é escandaloso, mas foi assim que venceu a tirania da morte, da opressão e da culpa! Pela sua morte somos livres para negarmos a nós mesmos, tomarmos nossa cruz e o seguirmos.
Naquele que por amor se humilhou até a morte de cruz,
Márcio Cardoso.
Uma cena nos Evangelhos que me toca especialmente é o sepultamento de Jesus! José, da cidade de Arimatéia, membro importante do Sinédrio e Nicodemos, um dos fariseus, desceram o corpo morto de Jesus da cruz, enrolaram-no em lençóis de linho com aromas e o depositaram num sepulcro novo em um jardim próximo ao Gólgota.
Que cena comovente! Que experiência carregada de humanidade e paixão! Imagino que um coquetel de sentimentos fervia na chaleira de suas almas...
O que se passava na mente de José de Arimatéia, seguidor de Jesus até então anônimo, ao tomar no colo o corpo desfigurado de Cristo coberto de sangue, pó, suor e lágrimas? E Nicodemos, que ficou com um nó na mente depois do encontro cheio de metáforas com Jesus, o que sentiu quando limpava as feridas de Cristo e o enrolava num lençol de linho? A especulação é infinita, tanto quanto nossa imaginação pode alcançar! É possível que aquele perfume tenha sido uma gostosa lembrança até o fim dos seus dias...
Mas interrompi a especulação pela constatação: o Cristo crucificado não parece nada atraente para muitos religiosos que preferem um deus útil, - uma ferramenta que se usa para um determinado fim.
Nas vitrines da fé os deuses que estão em oferta são aqueles que esbanjam somente força, autoridade, determinação e falsas promessas. Parece-me que um Deus como Jesus que morre mudo numa cruz, aparentemente inútil, não é o que interessa ao mercado religioso! O deus que “vende”, que dá ibope, que deixa a “casa cheia”, é o deus que “funciona”, o deus atendente de um balcão fast-food. O deus que interessa ao religioso moderno é aquele que cerca o homem de segurança de sorte que ele nunca vai conhecer a doença, o assalto, o desemprego, a falência, a desilusão amorosa... Pura ficção! “No mundo tereis aflições!”
O deus para quem correm as multidões não se parece em nada com o Jesus crucificado – o escândalo do Evangelho.
Mas voltando para o sepultamento dei um passo com a intenção de participar da cena! Queria ser José, queria ser Nicodemos a carregar Cristo morto no peito e sepultá-lo!
José de Arimatéia e Nicodemos abraçaram contra o peito o Cristo morto. O evangelista Marcos diz que José “dirigiu-se resolutamente a Pilatos e pediu o corpo de Jesus” (Mc 15.43).
O Deus que parece desnecessário ao mundo é quem eu tomo no colo; o Cristo que parece inútil, desfalecido, vencido é com quem me apego; o Messias escarnecido, transfigurado, sem formosura, transpassado, esgotado, crucificado é aquele que carrego! O Deus que não precisa fazer mais nada (está consumado!) já tem a minha amizade e devoção!
Respeito a Hora do meu Amigo e cuido dele...E quando cuido dele é Ele que cuida de mim! Eu cubro o corpo do Mestre e minhas mazelas são cobertas, cubro sua cabeça e Ele permeia minha mente; limpo os pés de Cristo e Ele declara os meus formosos; enrolo o corpo de Jesus no linho e minha vida é santificada; cuido de suas feridas e enxergo as minhas próprias, então Cristo me sara; banho-lhe no perfume e Ele me batiza no seu Ser; velo a sua morte e Jesus me ressuscita! ... E lembro o poema de Edward Shillito:
Outros deuses eram fortes; mas Tu fraco tinhas de ser;
A caminho do trono cavalgaram, mas Tu tropeçaste ali;
Nossas feridas apenas Deus pode entender,
E nenhum deus tem ferimentos além de Ti
Quem tem peito para carregar este Deus? Um Deus que parece vencido, que sofre zombaria, que está sendo abandonado pelos seus? Quem traz nos braços um Cristo que decepciona? É difícil ser fiel a um Deus assim. Como escreveu a filósofa cristã francesa Simone Weil “era difícil ser fiel ao Cristo. Era uma fidelidade em vão. Bem mais fácil ser fiel a Napoleão até a morte (...). Morre-se pelo que é forte, não pelo que é fraco, ou ao menos, por aquilo que, momentaneamente fraco, conserva uma auréola de força”.
Mas somente um Deus que teve ferimentos pode se identificar com os nossos ferimentos; somente um Deus que foi rejeitado pode lidar com as nossas rejeições; somente um Deus que levou sobre si os nossos pecados pode promover o perdão. “Pelas suas feridas fomos curados” (Is 53.5).
O sepultamento do qual falamos não é para o esquecimento, e sim para a ressurreição! Não estamos colocando Cristo num mausoléu para ser visitado por romeiros, muito menos em gesso, metal, madeira, enfim, num lugar de morte; mas sim num lugar existencial de onde Ele vai ressurgir por esses dias em meu coração e no seu, mas mesmo assim com os ferimentos do amor!
O Cristo crucificado é escandaloso, mas foi assim que venceu a tirania da morte, da opressão e da culpa! Pela sua morte somos livres para negarmos a nós mesmos, tomarmos nossa cruz e o seguirmos.
Naquele que por amor se humilhou até a morte de cruz,
Márcio Cardoso.
Comentários
e que belo retorno! grande texto!
Deus é mesmo esse com quem só posso me relacionar e nunca apreender! Toda apreensão (como conhecimento fechado) é ídolo e por isso todos nós temos ídolos! o que não podemos ser é idolatras que carregam seus ídolos pra onde vão. por isso, precisamos despertar para a ressurreição de Jesus! Ele Tá vivo! Viva o Encontro!