O que eu digo quando digo “Deus”? Cada palavra nos remete a uma experiência; trata-se de qual experiência? A experiência de Abraão? De Moisés? De Jesus?...
Não se fala de Deus em lugar algum da Bíblia. Evocamos com pudor, às vezes com temor, YHWH, o Tetragrama impronuniciável que designa essa realidade, para além e para o interior dos universos, esse “Nada” do Tudo cuja Causa é Ele... Para Moisés, é um “Eu Sou”: a afirmação de uma presença, não nascida, não feita, não criada, no coração daquilo que é feito, nascido, criado, composto. Sua realidade é inconcebível e seu Nome, impronunciável. No entanto, se fizermos a experiência do nosso nada após um abandono (não ser mais nada pra alguém) ou um acidente, nós poderemos nos interrogar sobre “o Ser que nos faz ser”, que permite que participemos durante algum tempo da Vida e do seu Sopro, já que a nossa vida só depende de um sopro...
Se Deus não é para nós uma experiência, uma liberdade no coração de nossos condicionamentos, uma leve brisa no coração de nossos arquejos, então Ele não passa de uma palavra, um palavra utilizada para cometer todo tipo de opressão e crime, mas também de atos nobres, corajosos e pacientes.
A palavra “Deus” vem do latim dies que quer dizer “dia”. Quando eu digo “Deus”, estou falando do dia, do dia luminoso; eu digo que o fundo do ser é luz, “clara luz”, acrescentarão os budistas, assim enriquecendo a expressão.
A luz é aquilo que não vemos e aquilo que nos permite ver. Quanto mais pura é a luz, tanto mais ela é transparente e menos a vemos. Assim com só conseguimos ver a luz quando o tempo está brumoso, só “vemos” Deus nos momentos de confusão mental e idolatria.
Deus não é algo a ser pensado, ele é a Inteligência que nos permite pensar.
Deus não é algo a ser amado, ele é o Amor que nos permite amar.
Ninguém jamais o viu, pois a luz não é para ser vista.
Aquele que ama mora e permanece em Deus e Deus mora e permanece nele.
Só conhecemos a Deus através da “participação”: sendo, participamos do Ser (YHWH); sendo inteligentes, participamos do Ser que é Inteligência, Informação criadora (logos); amando, participamos do Ser que é Amor não condicionado (Agape).
Deus não existe. Ele é. Se Deus existisse, como tudo aquilo que existe, um dia ele teria que deixar de existir. Dessa maneira, todos os deuses, investidos pelas nossas adorações cegas da existência, são ídolos. O verdadeiro Deus não existe e toda apropriação do “verdadeiro” é uma fábrica de ídolos por vezes mortíferos e perigosos. “Meu” Deus não é “teu” Deus e em nome desse Deus que “temos”, todos os crimes são permitidos...
Se Deus existe, todos os crimes são permitidos... e é exatamente isso o que acontece. Se alguns crimes não fossem cometidos em nome de Deus, eles não seriam possíveis, o homem não seria suficiente para inspirar isso ao homem: tantos horrores, carnificinas e assassinatos de inocentes...
Felizmente, Deus não existe; tudo mais existe, apenas Deus não existe, assim como a luz que não é uma coisa dentre as coisas, assim como o Ser que não é um ser dentre os seres existentes, assim como o Amor que não é um amor dentre nossos amores. Esse Deus resiste a se fazer “objeto” de nosso desejo.
Eu não posso acreditar em um Deus que fosse compreensível. Mas, então, como desejar um ser não-desejável ou que está incessantemente escapando dos enlaces afetivos, intelectuais e “crentes” de nossos amores... Como rezar para um Deus que não existe? Com entreter uma relação com nada?
Deus não se tornaria uma abstração, o Irreal por excelência, ainda mais do que o trans-real? Ele não é elevado demais, Outros demais, Todo Outro? Jacques Préver dizia: “Pai nosso que estais nos céus, ficais aí”.
Será que podemos permanecer em silêncio? Entrar em relação com esse silêncio? Saboreá-lo como uma presença? Um espaço, uma vastidão no coração de tudo aquilo que nos fecha, nos estreita, nos condiciona fisicamente, psiquicamente, socialmente e, acrescentemos também, cosmicamente, já que fazemos parte da grande natureza que nos envolve?
O vazio não é algo a ser feito, ele está sempre presente quando não o preenchemos com nadas. O silêncio não é algo a ser feito, ele está sempre presente quando não o preenchemos com barulhos, palavras, pensamentos ou lembranças. A página branca está sempre presente sob nossas garatujas ou sob nossas santas escrituras. A realidade que colocamos sob a palavra “Deus” talvez esteja neste silêncio, entre as linhas, entre as palavras, entre a inspiração e a expiração. Esse silêncio de onde vem o sopro e para onde retorna o sopro, de onde vem o pensamento e para onde retorna o pensamento, de onde vem a vida e para onde retorna a vida...
Não era esse silêncio que Jesus chamava de seu “Pai” e “nosso Pai”? A Fonte de seu ser, de seu pensamento, de suas palavras e do seu agir, o lugar de onde jorram o ser, o pensamento, as palavras e as ações justas... a ação humana, criada, adaptada à sua fonte divina incriada – um desejo humano muito humano e, no entanto, de acordo com o próprio desejo da grande Vida em nós, uma oração...?
Não se fala de Deus em lugar algum da Bíblia. Evocamos com pudor, às vezes com temor, YHWH, o Tetragrama impronuniciável que designa essa realidade, para além e para o interior dos universos, esse “Nada” do Tudo cuja Causa é Ele... Para Moisés, é um “Eu Sou”: a afirmação de uma presença, não nascida, não feita, não criada, no coração daquilo que é feito, nascido, criado, composto. Sua realidade é inconcebível e seu Nome, impronunciável. No entanto, se fizermos a experiência do nosso nada após um abandono (não ser mais nada pra alguém) ou um acidente, nós poderemos nos interrogar sobre “o Ser que nos faz ser”, que permite que participemos durante algum tempo da Vida e do seu Sopro, já que a nossa vida só depende de um sopro...
Se Deus não é para nós uma experiência, uma liberdade no coração de nossos condicionamentos, uma leve brisa no coração de nossos arquejos, então Ele não passa de uma palavra, um palavra utilizada para cometer todo tipo de opressão e crime, mas também de atos nobres, corajosos e pacientes.
A palavra “Deus” vem do latim dies que quer dizer “dia”. Quando eu digo “Deus”, estou falando do dia, do dia luminoso; eu digo que o fundo do ser é luz, “clara luz”, acrescentarão os budistas, assim enriquecendo a expressão.
A luz é aquilo que não vemos e aquilo que nos permite ver. Quanto mais pura é a luz, tanto mais ela é transparente e menos a vemos. Assim com só conseguimos ver a luz quando o tempo está brumoso, só “vemos” Deus nos momentos de confusão mental e idolatria.
Deus não é algo a ser pensado, ele é a Inteligência que nos permite pensar.
Deus não é algo a ser amado, ele é o Amor que nos permite amar.
Ninguém jamais o viu, pois a luz não é para ser vista.
Aquele que ama mora e permanece em Deus e Deus mora e permanece nele.
Só conhecemos a Deus através da “participação”: sendo, participamos do Ser (YHWH); sendo inteligentes, participamos do Ser que é Inteligência, Informação criadora (logos); amando, participamos do Ser que é Amor não condicionado (Agape).
Deus não existe. Ele é. Se Deus existisse, como tudo aquilo que existe, um dia ele teria que deixar de existir. Dessa maneira, todos os deuses, investidos pelas nossas adorações cegas da existência, são ídolos. O verdadeiro Deus não existe e toda apropriação do “verdadeiro” é uma fábrica de ídolos por vezes mortíferos e perigosos. “Meu” Deus não é “teu” Deus e em nome desse Deus que “temos”, todos os crimes são permitidos...
Se Deus existe, todos os crimes são permitidos... e é exatamente isso o que acontece. Se alguns crimes não fossem cometidos em nome de Deus, eles não seriam possíveis, o homem não seria suficiente para inspirar isso ao homem: tantos horrores, carnificinas e assassinatos de inocentes...
Felizmente, Deus não existe; tudo mais existe, apenas Deus não existe, assim como a luz que não é uma coisa dentre as coisas, assim como o Ser que não é um ser dentre os seres existentes, assim como o Amor que não é um amor dentre nossos amores. Esse Deus resiste a se fazer “objeto” de nosso desejo.
Eu não posso acreditar em um Deus que fosse compreensível. Mas, então, como desejar um ser não-desejável ou que está incessantemente escapando dos enlaces afetivos, intelectuais e “crentes” de nossos amores... Como rezar para um Deus que não existe? Com entreter uma relação com nada?
Deus não se tornaria uma abstração, o Irreal por excelência, ainda mais do que o trans-real? Ele não é elevado demais, Outros demais, Todo Outro? Jacques Préver dizia: “Pai nosso que estais nos céus, ficais aí”.
Será que podemos permanecer em silêncio? Entrar em relação com esse silêncio? Saboreá-lo como uma presença? Um espaço, uma vastidão no coração de tudo aquilo que nos fecha, nos estreita, nos condiciona fisicamente, psiquicamente, socialmente e, acrescentemos também, cosmicamente, já que fazemos parte da grande natureza que nos envolve?
O vazio não é algo a ser feito, ele está sempre presente quando não o preenchemos com nadas. O silêncio não é algo a ser feito, ele está sempre presente quando não o preenchemos com barulhos, palavras, pensamentos ou lembranças. A página branca está sempre presente sob nossas garatujas ou sob nossas santas escrituras. A realidade que colocamos sob a palavra “Deus” talvez esteja neste silêncio, entre as linhas, entre as palavras, entre a inspiração e a expiração. Esse silêncio de onde vem o sopro e para onde retorna o sopro, de onde vem o pensamento e para onde retorna o pensamento, de onde vem a vida e para onde retorna a vida...
Não era esse silêncio que Jesus chamava de seu “Pai” e “nosso Pai”? A Fonte de seu ser, de seu pensamento, de suas palavras e do seu agir, o lugar de onde jorram o ser, o pensamento, as palavras e as ações justas... a ação humana, criada, adaptada à sua fonte divina incriada – um desejo humano muito humano e, no entanto, de acordo com o próprio desejo da grande Vida em nós, uma oração...?
Comentários
Abraços.
muito legal!
Gostaria de entender mais o que realmente você entende em alguns parágrafos como: - Deus não existe. Ele é. Se Deus existisse, como tudo aquilo que existe, um dia ele teria que deixar de existir. Dessa maneira, todos os deuses, investidos pelas nossas adorações cegas da existência, são ídolos. O verdadeiro Deus não existe e toda apropriação do “verdadeiro” é uma fábrica de ídolos por vezes mortíferos e perigosos. “Meu” Deus não é “teu” Deus e em nome desse Deus que “temos”, todos os crimes são permitidos...
pois parece muito profundo...
e muito interessante crer como você crer!
Um abraço pastor Márcio!
Mas o autor quer defender a tese de que Deus como compreensão total da mente humana (verdadeiro Deus) não existe, pq se esse Deus existe, ele é um deus (ídolo) e não Deus.
Quando essa Realidade Última se torna reduzido a minhas definições, enquadramentos, ele se torna minha propriedade... e a história nos diz quantos crimes já se cometeram em nome de um "deus verdadeiro".
Deus não existe no sentido de que Ele não é cientificamente dominado, catalogado, sistematizável... assim com eu, você, a flor, os átomos... Mas Ele é! Uma Realidade Última indominável.
Para citar o autor "Ele é Nado do Tudo cuja a Causa é Ele"
beijão
Bem filosófico mesmo.
Muito legal.
Quem é o autor?
BJo
já vi quem é!
=D
Leloup em seu texto um Deus relativo em seus absolutos! Uma mistur de existêncialismo cristão com a pura e simples fé! Axo q depois deler esse texto irei ler minhas páginas brancas, e também tentar escrever nelas, não só encontrar e descobrir como também criar deixando ser criado...
"a ação humana, criada, adaptada à sua fonte divina incriada – um desejo humano muito humano e, no entanto, de acordo com o próprio desejo da grande Vida em nós, uma oração...?"
Abraço!