Pular para o conteúdo principal

GRAÇA: UM JEITO GOSTOSO DE VIVER!

Certo dia Simão recebe em sua casa Jesus e seus discípulos, Lázaro e suas irmãs. Eles chegam com os pés empoeirados, os rostos desidratados e cansados da caminhada. Seis dias antes da Páscoa o clima era tenso e reticente. Jesus já havia anunciado a sua morte. Subitamente entra na cena Maria que quebra um frasco de perfume e dá um banho em Jesus da cabeça aos pés! A macharada fica indignada pelo desperdício!
Maria quebra a rotina sisuda com um gesto de graça. Esta mulher adora para além do culto, da fala, da música. Ela ama para além das palavras: ela ama com gestos!
Eu enxergo nesta cena muito mais do que um ritual, do que uma prática dos antigos para receber seus convidados: óleo na cabeça, lavagem dos pés... Para mim Maria (da Graça) deu um banho de afeto em Jesus num momento muito delicado de sua vida!

MARIA ENXERGA NO MESSIAS UM ALVO DA GRAÇA
E NÃO O MESSIAS PARA UMA FUNÇÃO!
A palavra Messias carrega todo o peso de uma função, da tarefa, da missão de Jesus. Ele é o Ungido de Deus que traria salvação para a humanidade! Mas para Maria da Graça, o Messias é para além disso: ele é gente merecedora de afeto, alvo de bondade! Ele não é uma máquina fria, um andróide, um robocope. Cristo não é o Coisa: o homem de pedra! Ela olha para Jesus e não vê uma coisa utilitária; Maria vê gente!
Em nossa cultura do descartável, do utilitário, do consumismo nós acabamos coisificando as pessoas, definindo-as por suas tarefas simplesmente: marido, pastor, advogado, gari, faxineiro... O resultado é que nos tornamos intolerantes, muito exigentes e insensíveis às carências do outro. Somos ágeis nas cobranças, enchemos o outro de tarefas, criticamos e não exercitamos os gestos de afetos!
Na casa de Simão alguém poderia ter dito: “Ele é Deus, Maria, não precisa de chamego; Ele é o Rei intocável, absoluto, não vai sentir falta de demonstração de carinho”. Mas Maria pensa diferente! E Jesus também. No versículo 10 ele diz: “Ela praticou uma boa ação para comigo”. Jesus se surpreende, Jesus se alegra e poderia muito bem ter dito: “Maria, muito obrigado, eu estava precisando, você não imagina como foi importante o que você acabou de fazer; que gostoso receber essa demonstração de carinho!”.
Nesta cena Maria nos convida a olharmos para além do que as pessoas representam (perssona), para além dos seus papéis e enxergarmos ali humanos. Somente aí é que podemos ter uma relação de tolerância, ternura, bondade. Quando percebemos que atrás do título daquela pessoa tem uma criatura frágil, um ser tênue, uma mente complexa (como a nossa!), nós praticamos o amor!

EM MARIA A GRAÇA É CHEIRO QUE FAZ MEMÓRIA.

O perfume tem o poder de marcar época, de registrar momentos, de guardar memórias.
Este mesmo episódio narrado pelo evangelista João no capítulo 12.3 diz que “a casa inteira ficou cheia do perfume do bálsamo”. Eu imagino que depois daquela cena todos guardaram aquele perfume na memória de alguma maneira: alguns lembrariam como desperdício, outros como exagero de mulher e Cristo lembraria como o perfume da graça. E quem sabe se aquele cheiro não acompanhou Jesus até o Getsêmani (o jardim da sombra da morte)! Quem sabe o perfume vai com Cristo até a cruz! Quem sabe Jesus voltou para o Pai com a lembrança do gesto tão humano da Maria!
Jesus diz para aqueles que tentaram desmerecer o gesto de Maria: Eu lhes asseguro que em qualquer lugar do mundo inteiro onde este evangelho for anunciado, também o que ela fez será contado, em sua memória.
Ainda ouço Maria me chamar e ela me chama para fazer história com o perfume da graça; ela me inspira a fazer memória nas pessoas com gestos de delicadeza e doçura. Atos da graça marcam épocas assim como o perfume.
O conselho da Maria é: não subestime os pequenos gestos, eles podem ser, mesmo que você não fique sabendo, âncora de fé para as pessoas; um sinal do amor de Deus para o próximo. Maria nos chama para uma comunidade onde nós exercitamos os gestos; uma comunidade de gente de carne e osso que trocam olhares, acenos, afetos, abraço, gentileza, bom dia, cordialidades, solidariedade, afagos, o compartilhar, o ombro amigo. A igreja precisa ser esse lugar: aonde as pessoas chegam e se sentem acolhidas, aninhadas, seguras não por um poder mágico que faz promessas, mas pelo colo do irmão!
O reino de Deus é como uma pequena semente que quando plantada cresce e se torna uma árvore linda e frondosa onde as aves do céu podem se abrigar.
Que sejamos lembrados pelo amigo que fomos, pelo carinho que fizemos, pelo amor que compartilhamos, pelo perfume que espalhamos:
Mas graças a Deus, que sempre nos conduz vitoriosamente em Cristo e por nosso intermédio exala em todo lugar a fragrância do seu conhecimento; porque para Deus somos o aroma de Cristo entre os que estão sendo salvos e os que estão perecendo. 2Co 2.14,15

EM MARIA A GRAÇA PERDE AS CONTAS

Os discípulos fazem cálculos, colocam na ponta do lápis: “por que este desperdício? 300 denários!” Maria foi exagerada! Ela não calculou direito. Quebrou o gargalo do frasco e despejou todo o perfume na cabeça de Cristo. “Não exagera, Maria! Quer mostrar para Jesus que você o ama? Usa aquele óleozinho ali, mas não esse, Maria! Não seja tola! Pra que Maria, por quê?”
É porque a graça não sabe ser de outro jeito, a graça é assim: não sabe contar ou não quer contabilizar, a graça é ruim de matemática; a graça não é justa - a justeza da graça é ser ela flexível, misericordiosa!
Os últimos serão os primeiros. Aquele que vier a mim de modo algum lançarei fora. O filho pródigo que desperdiçou parte da herança é recebido pelo Pai com festa. Aquele que trabalhou apenas 1 hora ganha o mesmo valor de quem trabalhou o dia inteiro. Deus diz que vai destruir a cidade de Nínive e Jonas vai anunciar meio a contra gosto, a cidade se arrepende e Deus muda de idéia – coisas da graça! O poder de Deus se aperfeiçoa na fraqueza!
A graça anda pelos caminhos desses paradoxos; a graça é meio ilógica! A graça não conta quantas vezes deve fazer o bem.
Maria despeja na cabeça de Jesus um perfume caríssimo que correspondia a 1 ano de serviço de um trabalhador braçal! Maria é generosa na sua demonstração de afeto! Para o efeito que aquele gesto causaria em Jesus Cristo, o valor do perfume é nada para Maria! O afeto vale o preço!
Precisamos aprender com Maria a sermos mais desapegados dos bens em favor do outro; a sermos mais generosos para atender o outro mesmo que isso nos custe alguma coisa, ou muita coisa! Quanta gente está precisando, dentro e fora da igreja, daquilo que nós temos com fartura: seja conhecimento, seja dinheiro, sejam habilidades, seja carinho, sejam roupas, calçados e pão! Quantas pessoas estão precisando que nós sejamos mais generosos, mais humanos, mais sensíveis às suas necessidades.
Maria me chama para uma comunidade onde devo perder a conta para abençoar o outro - uma comunidade onde não se sovina a bondade, uma comunidade de graça desmedida!

Comentários

MARCIA SUSS disse…
Oi Marcinho

Legal seu texto. Como sempre você tem palavras que enchem o coração de nostalgia. O desejo amar a Deus.

O Luiz pregou no domingo usando o mesmo texto. A ênfase dele foi: A igreja precisa viver Marta, Maria e Lázaro - Serviço, Adoração e Milagre.
Anônimo disse…
Olá pastor,
Um texto bastante inspirador! Ele nos leva a refletir sobre essa Graça divina que, de tão amorosa e extravagante se humanizou em Jesus.
Deus te abençoe, mais e mais

Postagens mais visitadas deste blog

"Pureza de coração é desejar uma única coisa" (Sören Kierkegaard). Inspirado nessa verdade escrevi esta canção.

O Único Necessário Venha lapidar o meu querer possa meus desejos converter já sei o que pra mim é elementar mas luto contra o mal que perto está! Muitas são as fontes pra beber que distraem o meu interior de todas essas quero me abster - suspira o meu ser pelo Senhor! Tu és o meu único Desejo realmente nobre e necessário o jejum de ti é imprudência o seu rumo encontra a falência És Jesus, o Pão que me dá Vida Água que da Sede me sacia o Endereço certo da chegada Casa boa pra minha pousada!

Dúvida (Bartolomeu Campos de Queirós)

Dúvida (BARTOLOMEU CAMPOS DE QUEIRÓS) "É só a dúvida que nos une, que nos aproxima. É só disso que precisamos. Precisamos de amparo com a nossa dúvida. E a literatura nos ampara. Tenho muito medo da verdade. Não acredito que haja nada verdadeiro. Tive um professor de filosofia, o padre Henrique Vaz, para quem eu perguntei “o que era a fé”. Ele me respondeu que a fé é a dúvida. Tem dias que você tem muita, tem dias que tem pouca, tem dias que não tem nenhuma. Isso se chama fé, porque nos é possível somente a dúvida. Hoje, estamos com muita gente encontrando a verdade. Quando uma pessoa encontra a verdade, a única coisa que ela adquire é a impossibilidade de escutar o outro. Ela só fala, não escuta mais. Quem encontra a verdade só fala."

A Inveja da Morte

"A inveja da Morte" faz parte de um Pocket show autora que chamei de Poema Musical "O Amor em 5 atos". Essa obra canta algumas das estações de um relacionamento que vai desde a paixão, encontra a maturidade, enfrenta o medo da morte, passa pelos desencontros e celebra o objeto de amor. Em meu canal do YouTube você pode assistir as outras canções. Espero que goste! https://www.youtube.com/watch?v=24Kl-H5_mWI